Vanda Ribeiro - A Qualidade Educacional como Direito
https://www.youtube.com/watch?v=nktEEHBAImc
No quarto encontro do curso Educação e Direitos Humanos, os/as participantes foram convidados/as a pensar sobre o conceito de qualidade e o seu sentido na educação escolar. A reflexão foi conduzida pela professora doutora em educação, Vanda Mendes Ribeiro, que apresentou o tema da qualidade como direito a partir das discussões que relacionam os princípios da justiça às relações sociais no contexto da escola.
A perspectiva inédita de universalização
dos direitos sociais promovida pela Constituição Federal de 1988 ganha
contornos especiais no capítulo da educação, sobretudo por reconhecer que o
direito à educação consiste não somente no acesso e na permanência, mas também
na garantia do padrão de qualidade. Noção de qualidade que, ao longo do tempo,
sempre assumiu como característica marcante a constante mudança da sua
concepção.
Primeiro, o significado da qualidade estava
diretamente ligado ao acesso, afinal, estar na escola era o grande desafio em
um país de analfabetos/as. Nesse cenário, a máxima, entre os/as governantes,
era a construção de prédios escolares, a expansão da rede de ensino, sem
nenhuma preocupação com a adaptação de novo contingente ou com a reestruturação
do ambiente escolar.
“Todos já ouvimos falar que a educação
antigamente era muito melhor, que com a massificação o ensino ficou horrível e
que escola de boa qualidade existiu até a década de 1960. Sim, a escola era
ótima para quem tinha acesso, mas para a maioria da população excluída ela não
tinha significado algum.”, ressalta Vanda.
A professora comenta como é interessante
notar a percepção dos pais ou responsáveis sobre a escola de qualidade.
Pesquisas mostram que os pais, antes excluídos dos sistemas de ensino, ao serem
questionados sobre a qualidade da escola pública, respondiam, em sua ampla
maioria, estarem satisfeitos. “O que é muito comum em um contexto no qual eles
não tiveram acesso e onde tudo o que for oferecido para seus filhos/as já é
muito mais do que eles tiveram”.
Porém, quase na mesma medida em que
cresciam as oportunidades educacionais, aumentavam os obstáculos relativos ao
prosseguimento dos estudos. E então, a qualidade da educação passou estar
relacionada à permanência bem sucedida na escola. As preocupações, agora, são
com os índices de evasão e repetência.
A saída encontrada para regularizar tal
demanda também não contemplou a construção de um projeto educacional de nação,
o combate à reprovação teve como remédio políticas de aprovação automática,
ciclos e progressão continuada.
Por fim, a educação brasileira começou a
incorporar outra variável na definição de qualidade: a igualdade de
conhecimento adquirido ou os índices de desempenho. Nesse ponto, Vanda destaca
a importância dos testes padronizados em larga escala. “Eu digo isto porque sei
que tem muita gente crítica em relação aos testes padronizados em larga escala.
Eu defendo que eles em si podem ser muito favoráveis à melhoria e à
democratização. É muito importante que tenhamos clareza de que o problema não
são os testes e como tudo na área da educação eles também são objetos de
disputa, eles também podem ser mal utilizados. Mas estão longe de ser um mal em
si”, conclui.
Na opinião de Vanda, o problema é que
esperam do teste padronizado em larga escala uma avaliação do todo, que
contemple as inúmeras nuances do cenário em estudo. Ela ressalta que eles não
conseguem mensurar todo o processo de aprendizado – e nem tem essa função –,
mas sim medir os conteúdos previstos na grade curricular, por exemplo, e
interpretá-los ou compará-los a partir generic cialis de um recorte, de uma
pequena parte.
Ela defende que a qualidade não pode ser
pensada de maneira isolada, existem três dimensões relevantes que devem ser
sempre consideradas de maneira equilibrada, são elas: a dimensão dos insumos,
que correspondem aos aspectos infraestruturais e recursos financeiros, ; a
dimensão do processo, que tem a ver com as escolhas feitas pelas unidades
escolares para atingir o objetivo final, podendo ser ele a melhora do
desempenho, por exemplo; e por fim, a dimensão do resultado, já que na vida
prática a consequência do processo escolar tem um impacto sobre a sociedade e
as desigualdades geradas por ela. “Eu não posso parar a discussão de qualidade
na fase de insumo e na prática que eu realizo, é preciso ver o resultado que
isso gera.”, alerta.
O papel do Estado na garantia dos bens sociais
Ao revisitar os/as pensadores/as das
teorias distributivas da justiça, Vanda assume a educação como sendo um bem
social significativo, que interfere na produção de desigualdades na sociedade.
“Uma coisa é eu chegar a uma empresa com um diploma da USP, tendo passado por
uma melhor escola, e outra coisa é eu chegar com um diploma de outra escola
particular, que não é tão bem considerada. O bem social educação, a trajetória
escolar e o acesso, sobretudo nas sociedades em desenvolvimento, são
definidores da posição vantajosa na vida social.”, salienta.
No âmbito dessa discussão, desponta a
necessidade da definição de um meio legítimo de distribuição desse bem social
que é a educação escolar, sempre considerando a grande influência exercida pela
origem social na representação universal de igualdade e liberdade, comum em
sociedades democráticas.
Nesse sentido, Vanda acredita que a melhor
maneira de acomodar tal contradição, que consiste no que ela chama de peso da
origem social na representação de igualdade e liberdade dos indivíduos, é
contar com a participação do Estado como responsável pela criação/implementação
de arranjos institucionais que, sem sobrepor a liberdade e os direitos
individuais, corrijam as desigualdades, afastando o ideal de meritocracia como
único critério para o acesso aos bens sociais.
Para Vanda, o Estado tem a obrigação de
garantir a equidade entre as pessoas. “Afinal, o acesso aos bens sociais é um
campo em constante disputa, não há posições vantajosas para todos. A sociedade
não pode caminhar autonomamente, entregue unicamente ao critério de mérito,
porque justamente as relações sociais na sociedade capitalista são geradoras de
desigualdades que precisam ser mediadas.”. Ela complementa dizendo que um
Estado forte não deve prescindir da liberdade básica do indivíduo, precisa na
verdade buscar um equilíbrio capaz de dar continuidade à ideia de que todos/as
possam cooperar na vida social e que nenhum grupo viva de maneira indigna.
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