quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Lei da mordaça e crise de representatividade limitam a voz dos professores na cobertura educacional, avaliam jornalistas

By VOZES DA EDUCAÇÃO - 18/12/2013 5:22:53
Profissionais debateram relação entre professores e mídia durante evento realizado pela Rede Vozes da Educação no dia 19 de novembro

Por quê afinal os professores não aparecem nas matérias que tratam de temas educacionais? Esta foi a pergunta que norteou o debate promovido pela Rede Vozes no dia 19 de novembro, com a presença dos jornalistas Paulo Saldaña, de O Estado de S.Paulo; Karina Yamamoto, do UOL Educação; do secretarário de assuntos educacionais da Confederação Nacional de Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, e da jornalista e pesquisadora da Faculdade de Educação da USP Fernanda Campagnucci.
Estando entre as cinco maiores categorias profissionais do país, os docentes – quando aparecem – têm sua imagem estereotipada e não são valorizados na cobertura de temas com os quais lidam todos os dias. Entre os motivos que levam a isso, os debatedores destacaram a ainda presente Lei da Mordaça, o foco excessivo em conflitos públicos e a crise de representatividade de sindicatos docentes.

Para o jornalista da área de educação do Jornal O Estado de S.Paulo, Paulo Saldaña, existe uma série de motivos para que o professor não seja inserido na maior parte das matérias jornalísticas. “Apesar de a lei da mordaça ter caído em 2009 e 2010, na rede estadual e municipal de São Paulo, respectivamente, ela é muito presente no cotidiano da escola e as punições ainda ocorrem”, afirmou o jornalista ao comentar sobre a lei que proibia os professores de se referirem de maneira depreciativa às autoridades e aos atos da administração, mas que ainda “é muito presente no clima da escola” e que acaba “dificultando o trabalho de apuração das reportagens”.
Além disso, Paulo avaliou também que os próprios professores não costumam dar entrevistas por não confiarem na imprensa e não se enxergarem nas abordagens feitas por ela. “Os professores não confiam na mídia e acham que a cobertura de manifestações, por exemplo, é sempre voltada só para um dos lados”, disse. E complementou: e ele não quer se associar a imagem ruim que é divulgada, de que ele é o problema da educação e de que tem uma má formação. Ele não quer se colocar como o exemplo deste estereótipo de professor que é construído na imprensa”.

O  professor como notícia


Segundo levantamento feito pela Rede Vozes da Educação e pelo Observatório da Educação, ocorreram manifestações docentes em todas as redes estaduais de ensino e em pelo menos 118 municípios brasileiros em 2013. No entanto, de acordo com a editora de educação do portal UOL, Karina Yamamoto, na maior parte das vezes, os professores só aparecem na mídia ao mudarem o cotidiano da cidade (com protestos e manifestações), ao protagonizarem situações emotivas, ao chamarem a atenção com iniciativas “exemplares” ou ao cometerem alguma infração e “virarem caso de polícia”.
“Por mais cruel que possa parecer, o fato de serem professores ou não vai ser menos importante do que se um determinado protesto fechar a Avenida Paulista, por exemplo”, analisou a jornalista. Ao refletir sobre como aumentar a presença docente na cobertura educacional, Karina alertou que a categoria deve estar atenta à utilização e ao apelo por meio de imagens: “a gente tem que pensar a imprensa como um campo de batalha e é no território da imagem que a gente está disputando. Não tinha como se ignorar, por exemplo, a imagem do dia sete de outubro no Rio de Janeiro [Veja foto abaixo]. Os professores tomaram do centro do Rio até a Câmara dos Vereadores e essa imagem foi para a capa dos jornais e para a página inicial do UOL. Na disputa por espaço, a gente tem que levar isso em conta”, argumentou.
Neste mesmo sentido, Paulo Saldaña relatou a dificuldade da imprensa em cobrir uma manifestação para além do noticioso, de problemas no trânsito e que afetam a clamada classe média. “Em qualquer manifestação a violência acaba ganhando as manchetes e isso mostra uma dificuldade grande de se conseguir mostrar quais são as reivindicações de quem está protestando”, comentou o jornalista ao afirmar também que são poucos os jornais que possuem repórteres que cobrem exclusivamente a área da educação.


Crise de representatividade


Apesar de reconhecerem a importância das organizações sindicais e de afirmarem ouvir muitas delas em várias de suas apurações, Paulo e Karina expuseram a dificuldade em saber quem é o “porta voz do professor”.
“Recentemente tanto o governo do estado quanto a Prefeitura de São Paulo quebraram o sistema de ciclos, aumentando a possibilidade de reprovação dos alunos. Me parece que a maioria dos professores das redes apóiam a mudança, mas os pesquisadores da USP, por exemplo, acham um absurdo. E de quem é a opinião correta? Eu acredito que devemos ouvir todos os lados, mas ainda sim é difícil porque nunca vamos conseguir que todos os grupos se sintam realmente representados”, disse Paulo, ao citar que no estado de São Paulo existem dois sindicatos que podem representar a categoria dos professores da rede estadual (CPP e Apeoesp), mas que, em muitas vezes, possuem opiniões divergentes.

Ainda sobre o desafio da busca por fontes de informação, Karina afirma que esta é uma dificuldade constante, apesar de tentarem ouvir o maior número de pessoas. “Sempre nos perguntamos como vamos chegar ao professor, além de já tentarmos escutar fontes como o especialista em educação, o líder sindicalista, o diretor da escola e a secretaria de educação. Mas me parece que o professor ainda tem pouca voz na mídia”, reconhece a editora.

A educação integral e o ofício do(a) educador(a) de arte (Parte 1 de 2)


Estudo indica que muitos recursos educacionais digitais têm restrições de uso e distribuição

Qui, 23 de Outubro de 2014 15:31
Pesquisa mapeou 22 portais de recursos educacionais. Apesar da intenção de liberar conteúdos, desconhecimento de licenças livres e Lei de Direitos Autorais restritiva ainda são desafios para a abertura de materiais para uso educacional

Debate Desafios da Conjuntura, promovido pelo Observatório da Educação na terça-feira (10/09), apresentou os resultados da pesquisa Recursos Educacionais Abertos no Brasil: o campo, os recursos e sua apropriação em sala de aula (veja aqui a publicação do relatório). O estudo, que procurou mapear os principais atores do campo dos Recursos Educacionais Abertos (REA) no país e desafios para apropriação destes materiais, revela que, embora haja intenção de liberar conteúdos em 49,3% dos recursos educacionais analisado analisados, 43,7% ainda tinha todos os direitos reservados, aumentando a insegurança jurídica de seu uso educacional.
Segundo a definição da Unesco, os REA são materiais de ensino, aprendizagem e pesquisa – digitais ou não – que são disponibilizados de modo a permitir seu uso, adaptação e redistribuição de forma gratuita, geralmente em licenças Creative Commons (saiba mais aqui). Seu princípio é o de considerar livros didáticos, artigos de pesquisa, vídeos, testes, softwares e qualquer outra ferramenta, material ou técnica como bens públicos, com nenhuma ou o mínimo de restrições possíveis.
A pesquisa, realizada pela Ação Educativa com apoio da Wikimedia Foundation, analisou 22 portais de recursos educacionais on-line (em sua maioria voltados à educação básica) e 231 recursos educacionais abertos, com objetivo de mapear as produções existentes no que diz respeito à sua missão, aos tipos de licença adotadas, a que etapas e modalidades da educação são direcionadas, em que áreas do conhecimento, se permitem ou não a colaboração dos usuários, quais são os critérios de busca e se possuem algum tipo de suporte específico para o uso em sala de aula.
Um dos itens analisados pela pesquisa foi a condição dos direitos autorais dos materiais encontrados, considerados uma das principais barreiras à circulação deste materiais. O estudo revelou que, dos recursos educacionais disponíveis nos portais analisados, 43,7%, tinha direito autoral padrão (todos os direitos reservados); 13,4% detinha direito autoral padrão com intenção de flexibilizar; 22% com recursos licenciados de forma flexível (Creative Commons, atribuição, não comercial e/ou sem derivações); 10,8% eram de domínio público; e somente 4,3% disponibilizam os recursos de forma livre (Creative Commons, atribuição; e Creative Commons, atribuição, compartilha igual). O restante, 5,6%, não foi possível determinar.
A pesquisa também ouviu 30 pessoas, entre pensadores que lidam direta ou indiretamente com REA, produtores de conteúdos educacionais digitais e gestores públicos, com o objetivo mapear posições sobre a produção e circulação destes materiais. Representantes de organizações da sociedade civil e da academia identificaram que a falta de conhecimento sobre como se licenciar uma obra é uma das principais barreiras para o avanço dos REA no Brasil. Ainda que a maioria dos portais expressem em sua missão a intenção de fazer circular o conhecimento e promover o direito à educacão, predominam recursos sob o direito autoral padrão. Em alguns casos há uma tentativa de se colocar uma licença alternativa que falha em se cumprir por falta de conhecimento sobre licenças flexíveis.
“Por outro lado, o número mostra que há uma consciência sobre a necessidade de se flexibilizar os direitos autorais e um conhecimento genérico sobre as licenças alternativas que, por vezes, esbarra em uma legislação excessivamente restritiva. Caso a intenção de flexibilização tivesse de fato se materializado, o número de recursos flexíveis, livres, e em domínio público superaria o de conteúdos protegidos, chegando a quase 50% da amostra analisada”, aponta o relatório.

REA e direito à educação


Segundo a coordenadora da pesquisa, Jamila Venturini, todos os entrevistados encaram os REA como um dos desafios a se considerar para que haja uma transformação estrutural da escola. “Para muitos entrevistados isso tem a ver com uma mudança na cultura escolar, na transformação das relações entre professores e alunos, na superação da relação entre recepção e transmissão da informação e do conhecimento”, explicou durante o debate de lançamento da pesquisa (leia aqui o texto de cobertura). “Talvez a gente tenha um sistema que não necessariamente valoriza o professor nesse papel de criação de conteúdo, de intelectual.”
Para Priscila Gonzalez, coordenadora do Instituto Educa Digital e membro da Comunidade REA Brasil,ainda que o uso de recursos educacionais abertos seja pequeno no Brasil, há muito uso de objetos digitais em sala de aula. Segundo ela, os professores criam muitos objetos, mas compartilham pouco. “Os professores não se reconhecem como autores, a autoria vem de fora. Esse é o ponto mais importante quando a gente fala de educação aberta e de REA. É mais do que licença, é valorizar o ponto de vista pedagógico que essa a questão traz”, defendeu.
Segundo dados da pesquisa TIC Educação de 2013, 96% dos 1.987 professores da educação básica entrevistados em todo o país utilizam recursos obtidos na internet para a preparação de suas aulas ou para a realização de atividades com alunos. A maioria deles, 82%, já produzem conteúdos para suas aulas ou atividades com alunos com o auxílio das novas tecnologias.
Quando o assunto é a possibilidade de interagir com o material, criando novas versões e obras derivadas, 88% declararam fazer alterações nos materiais originais, contra 11% que não o fazem e somente 1% que acredita que não é possível editar ou usar os conteúdos de um modo diferente. Apenas 21% deles, porém, os publica as obras derivadas de alguma maneira.

Educação e direitos autorais


Considerada a quarta mais restritiva do mundo, segundo levantamento do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (Gpopai) da USP, a atual Lei brasileira de Direitos Autorais (Lei 9.610/1998) impõe uma série de limitações ao uso de recursos com fins educacionais. Pela lei atual, filmes e músicas, por exemplo, só podem ser usados em atividades educativas com autorização do autor. Paródias ou uso de trechos por parte de alunos para criar produções próprias também são proibidas.Também não é possível copiar integralmente obras que ainda não estejam sob domínio público, ainda que para uso educacional. A única exceção é a reprografia (xerox) de “pequenos trechos”, feitos pelo próprio copista.
De acordo com a Rede pela Reforma da Lei de Direitos Autorais, que atuou durante debates de reformulação de lei a partir de 2007, a legislação atual é extremamente tímida ao tratar do direito de pessoas com deficiência. “Somente pessoas com deficiência visual são citadas nominalmente - mas mesmo nesse caso a legislação não prevê fiscalização para garantir que os detentores de direitos atendam suas necessidades. Assim, por exemplo, há grande dificuldade para que essas pessoas consigam de editoras versões digitais de livros para gerar versões em braile ou em áudio”, afirmam as entidades da rede, em publicação sobre o tema.

Em debate realizado pelo Observatório durante o processo de reformulação da Lei de Dirietos Autorais (LDA) em 2010, Carlos Affonso, professor de Direito da Faculdade Getúlio Vargas, apontou como estas restrições podem impactar a realização do direito humano à educação por limitar a circulação das obras. “Atualmente há desequilíbrio entre o incentivo à criação e o acesso ao conhecimento e à informação”, diz.
Em 2007, o Ministério da Cultura criou o Fórum Nacional do Direito Autoral, com o objetivo de promover e debater uma reforma da LDA atual. Após uma série de seminário, conferências e consultas, o Ministério da Justiça preparou um anteprojeto de reforma do direito autoral, que foi submetido à consulta pública em 2010. A proposta previa, entre outros pontos, que a possibilidade de exibição de filmes e de execução de músicas sem a autorização do autor para fins educacionais, a autorização para que bibliotecas, museus e outros órgãos de preservação do patrimônio cultural pudessem fazer cópias de obras que poderiam se perder, e a cópia livre de obras esgotadas, desde que sem fins comerciais, como é prática comum no ensino superior.
Em 2010, no entanto, a então Ministra da Cultura Ana de Hollanda brecou o processo de reforma da reforma da lei, que só voltou a ser debatida em outubro de 2012, na gestão de Marta Suplicy, que realizou uma série de modificações na proposta. O anteprojeto está agora na da Casa Civil e aguarda há algum tempo para ser enviado ao Congresso.

REA e políticas públicas


Apontados como alternativas às restrições do direito autoral e ao engessamento da escola, diversos projetos de lei, nos âmbitos federal, estadual e municipal, procuram incorporar a lógica de abertura e a flexibilidade das licenças livres dos REA às políticas públicas. O estado de São Paulo chegou a ter aprovada a lei nº 989/2011, que previa que fosse considerado um recurso aberto todo o conhecimento que for comprado ou desenvolvido com recursos públicos pela administração pública estadual. No entanto, ela foi vetada pelo governador e aguarda possibilidade de derrubada do veto pela Assembleia Legistativa do estado. Há ainda iniciativas no Distrito Federal e no Paraná. No âmbito federal, o Projeto de Lei Federal nº 1513/2011 está em tramitação da Câmara (saiba mais detalhes sobre os projetos).



Pesquisado em 25/10/2014

Uma nova etapa na luta por exigibilidade jurídica do direito à educação de qualidade

Por Administrator             
Qui, 02 de Outubro de 2014 20:20
Com julgamento de recurso do Município de São Paulo, Tribunal de Justiça concluiu a análise de Ação Civil Pública sobre acesso e qualidade da educação infantil, abrindo um novo ciclo na forma de se exigir judicialmente esse direito

No último dia 1º de setembro, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) publicou decisão de sua Câmara Especial, na qual julga improcedente o recurso de embargo declaratório que havia sido proposto pelo Município de São Paulo com o objetivo de revisão do acórdão de dezembro de 2013, que determina a apresentação de plano de expansão de vagas em educação infantil, respeitados alguns parâmetros de qualidade, além de outras medidas.  Com o encerramento dessa etapa, a decisão passa a ter efeitos, ainda que seja possível à prefeitura recorrer para os tribunais superiores, em Brasília.

Segundo a decisão, que tomou como base jurídica o planejamento proposto pela própria Prefeitura em seu Plano de Metas 2013 – 2016 (artigo 69-A da Lei Orgânica do Município) e no PPA 2014 – 2017, o Município deve criar 150 mil novas vagas em educação infantil até 2016, sendo 105 em creches. Determinou ainda que o Município apresente em juízo, no prazo de 60 dias, um plano de ampliação de vagas e construção de unidades, de forma a cumprir a ampliação e qualificação proposta. Tanto pela forma como foi conduzido o processo, com a realização de inédita audiência pública no Tribunal, como em razão do conteúdo do acórdão, trata-se de posição judicial paradigmática, que pode vir a influenciar a resposta jurisdicional relacionada à apreciação de violações sistemáticas a outros direitos sociais.

Quanto ao conteúdo, a decisão confirmada no último mês é inovadora em ao menos três aspectos muito importantes.


O sistema de justiça (Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública e advocacia pública e privada) é frequentemente acusado de reproduzir em suas demandas e decisões uma visão individualista, que esconde a complexidade dos direitos e desconsidera os fatores determinantes da desigualdade e das discriminações no País. Não por acaso, à medida que aumentam as pressões populares pela realização de direitos há tempos prometidos pela Constituição, passamos a refletir cada vez mais sobre o papel desse Sistema no controle e no acompanhamento de políticas públicas que devem ser implementadas pelos governos. Há aqueles que dizem que o Judiciário não deveria interferir em políticas públicas, ou que deveria fazê-lo com o menor impacto possível. Argumentam que o Judiciário, por ser o único poder que não é eleito, não teria legitimidade democrática para interferir nas decisões dos demais. Além disso, suas decisões, majoritariamente individuais, acabariam atrapalhando e desorganizando os poderes que formulam ações e políticas públicas que têm como horizonte a promoção coletiva de direitos. O Judiciário, assim, viria mais atrapalhar do que ajudar. Seria fonte de irracionalidade e de injustiça.

É sintomático, no entanto, que a crítica à chamada “judicialização” no campo dos direitos sociais ganhe força justamente quando as classes populares passam a se utilizar dos instrumentos de exigibilidade jurídica para alcançar o exercício de direitos básicos, como acesso igualitário à educação e a medicamentos e tratamentos de saúde. É verdade, diga-se, que nem sempre a individualização das demandas é a melhor solução jurídica para alcançar esses direitos, mas não se trata de negar sua justiciabilidade e sim construir novas formas de decisões jurisdicionais. Decisões que venham a fortalecer os direitos em questão, cobrando aceleração de programas, prioridade e combate às desigualdades.

Portanto, o primeiro aspecto inovador da decisão sobre educação infantil em São Paulo é o vínculo estabelecido entre a decisão e as obrigações de planejamento e de financiamento à educação. O Tribunal determinou ao Município a apresentação de Plano de Expansão e Qualificação de sua rede de educação infantil, a ser assegurado no orçamento municipal, respeitados os compromissos juridicamente assumidos pela Prefeitura. Não coube ao Judiciário desenhar tal plano ou determinar, nessa ação, o modelo de expansão a ser adotado. As 150 mil novas vagas incorporadas à decisão judicial eram compromisso prévio da atual gestão. Essa nova modalidade de diálogo entre os poderes e entre estes e a sociedade civil organizada, somente possibilitada pela realização de Audiência Pública, é um indicativo muito importante sobre como o sistema de justiça deve atuar para oferecer respostas adequadas a situações complexas. Situações que, no jargão popular, não podem ser resolvidas em uma “canetada”.

O segundo aspecto inovador é que o texto da decisão, de caráter amplo e coletivo, incorporou amplamente todo o referencial normativo sobre qualidade da educação infantil, tanto aquele produzido no âmbito do Ministério da Educação e do Conselho Nacional de Educação como os parâmetros de qualidade produzidos pelo próprio Município. Esse reconhecimento judicial do caráter indissociável das dimensões do acesso e da qualidade é uma lição inestimável para as iniciativas futuras a serem adotadas pelo sistema de justiça. Não será admissível, nesse contexto, que a ampliação de vagas se dê em detrimento das condições de oferta, da valorização das(os) trabalhadoras(os) da educação, da superlotação de unidades ou da redução da jornada educacional.

Comitê Interinstitucional de Monitoramento é instituído e passa a funcionar em outubro


O terceiro aspecto de inovação se dá na adoção de um novo modelo de acompanhamento da execução da decisão, que privilegia a continuidade do diálogo interinstitucional como complementação ao processo civil tradicional. Na decisão de setembro foi confirmada a criação, por sugestão do Grupo de Trabalho Interinstitucional sobre Educação Infantil (GTIEI), de um mecanismo de monitoramento permanente, vinculado à Coordenadoria da Infância e da Juventude do TJSP. A partir disso, por sugestão do GTIEI, foi instituído junto a essa coordenadoria um Comitê Interinstitucional de Monitoramento que terá as funções de avaliar o andamento das políticas públicas voltadas ao cumprimento da decisão e de oferecer informações ao Judiciário. A Coordenadoria, com a participação do Comitê, produzirá relatórios semestrais a serem encaminhados aos juízes responsáveis pelo caso.

Do Comitê participarão a Ação Educativa e demais associações do Movimento Creche para Todos, o Ministério Público, a Defensoria Pública, o GT de Educação da Rede Nossa São Paulo, o Fórum Paulista de Educação Infantil, o Fórum Municipal de Educação Infantil e especialistas. Também foi acerta a continuidade da realização de reuniões periódicas com a participação do Secretário Municipal de Educação e de técnicos da Secretaria. Registre-se que em todo o processo, antes e depois da decisão, o atual Secretário César Callegari esteve presente e aberto à interlocução, o que é em si um fator essencial para a consolidação desse modelo dialógico e participativo de exigibilidade judicial.

Saber em que medida esse novo paradigma de atuação junto ao sistema de justiça será capaz de impulsionar a realização dos direitos educativos da população ou ainda o quanto aprimorará a própria atuação do Judiciário, do Executivo e da sociedade civil nesse campo são questões que dependerão, em muito, da capacidade de acompanharmos essa decisão e de seguirmos mobilizados na cobrança por prioridade à educação infantil de qualidade, na luta contra a desigualdade no acesso a direitos, por maior agilidade nos processos de construção e contratação e valorização de docentes e por maior justiça na arrecadação e destinação dos recursos públicos.

Formação em Direitos Humanos

Vanda Ribeiro - A Qualidade Educacional como Direito


https://www.youtube.com/watch?v=nktEEHBAImc


No quarto encontro do curso Educação e Direitos Humanos, os/as participantes foram convidados/as a pensar sobre o conceito de qualidade e o seu sentido na educação escolar. A reflexão foi conduzida pela professora doutora em educação, Vanda Mendes Ribeiro, que apresentou o tema da qualidade como direito a partir das discussões que relacionam os princípios da justiça às relações sociais no contexto da escola.

A perspectiva inédita de universalização dos direitos sociais promovida pela Constituição Federal de 1988 ganha contornos especiais no capítulo da educação, sobretudo por reconhecer que o direito à educação consiste não somente no acesso e na permanência, mas também na garantia do padrão de qualidade. Noção de qualidade que, ao longo do tempo, sempre assumiu como característica marcante a constante mudança da sua concepção.

Primeiro, o significado da qualidade estava diretamente ligado ao acesso, afinal, estar na escola era o grande desafio em um país de analfabetos/as. Nesse cenário, a máxima, entre os/as governantes, era a construção de prédios escolares, a expansão da rede de ensino, sem nenhuma preocupação com a adaptação de novo contingente ou com a reestruturação do ambiente escolar.

“Todos já ouvimos falar que a educação antigamente era muito melhor, que com a massificação o ensino ficou horrível e que escola de boa qualidade existiu até a década de 1960. Sim, a escola era ótima para quem tinha acesso, mas para a maioria da população excluída ela não tinha significado algum.”, ressalta Vanda.

A professora comenta como é interessante notar a percepção dos pais ou responsáveis sobre a escola de qualidade. Pesquisas mostram que os pais, antes excluídos dos sistemas de ensino, ao serem questionados sobre a qualidade da escola pública, respondiam, em sua ampla maioria, estarem satisfeitos. “O que é muito comum em um contexto no qual eles não tiveram acesso e onde tudo o que for oferecido para seus filhos/as já é muito mais do que eles tiveram”.

Porém, quase na mesma medida em que cresciam as oportunidades educacionais, aumentavam os obstáculos relativos ao prosseguimento dos estudos. E então, a qualidade da educação passou estar relacionada à permanência bem sucedida na escola. As preocupações, agora, são com os índices de evasão e repetência.

A saída encontrada para regularizar tal demanda também não contemplou a construção de um projeto educacional de nação, o combate à reprovação teve como remédio políticas de aprovação automática, ciclos e progressão continuada.

Por fim, a educação brasileira começou a incorporar outra variável na definição de qualidade: a igualdade de conhecimento adquirido ou os índices de desempenho. Nesse ponto, Vanda destaca a importância dos testes padronizados em larga escala. “Eu digo isto porque sei que tem muita gente crítica em relação aos testes padronizados em larga escala. Eu defendo que eles em si podem ser muito favoráveis à melhoria e à democratização. É muito importante que tenhamos clareza de que o problema não são os testes e como tudo na área da educação eles também são objetos de disputa, eles também podem ser mal utilizados. Mas estão longe de ser um mal em si”, conclui.

Na opinião de Vanda, o problema é que esperam do teste padronizado em larga escala uma avaliação do todo, que contemple as inúmeras nuances do cenário em estudo. Ela ressalta que eles não conseguem mensurar todo o processo de aprendizado – e nem tem essa função –, mas sim medir os conteúdos previstos na grade curricular, por exemplo, e interpretá-los ou compará-los a partir generic cialis de um recorte, de uma pequena parte.

Ela defende que a qualidade não pode ser pensada de maneira isolada, existem três dimensões relevantes que devem ser sempre consideradas de maneira equilibrada, são elas: a dimensão dos insumos, que correspondem aos aspectos infraestruturais e recursos financeiros, ; a dimensão do processo, que tem a ver com as escolhas feitas pelas unidades escolares para atingir o objetivo final, podendo ser ele a melhora do desempenho, por exemplo; e por fim, a dimensão do resultado, já que na vida prática a consequência do processo escolar tem um impacto sobre a sociedade e as desigualdades geradas por ela. “Eu não posso parar a discussão de qualidade na fase de insumo e na prática que eu realizo, é preciso ver o resultado que isso gera.”, alerta.

O papel do Estado na garantia dos bens sociais


Ao revisitar os/as pensadores/as das teorias distributivas da justiça, Vanda assume a educação como sendo um bem social significativo, que interfere na produção de desigualdades na sociedade. “Uma coisa é eu chegar a uma empresa com um diploma da USP, tendo passado por uma melhor escola, e outra coisa é eu chegar com um diploma de outra escola particular, que não é tão bem considerada. O bem social educação, a trajetória escolar e o acesso, sobretudo nas sociedades em desenvolvimento, são definidores da posição vantajosa na vida social.”, salienta.

No âmbito dessa discussão, desponta a necessidade da definição de um meio legítimo de distribuição desse bem social que é a educação escolar, sempre considerando a grande influência exercida pela origem social na representação universal de igualdade e liberdade, comum em sociedades democráticas.

Nesse sentido, Vanda acredita que a melhor maneira de acomodar tal contradição, que consiste no que ela chama de peso da origem social na representação de igualdade e liberdade dos indivíduos, é contar com a participação do Estado como responsável pela criação/implementação de arranjos institucionais que, sem sobrepor a liberdade e os direitos individuais, corrijam as desigualdades, afastando o ideal de meritocracia como único critério para o acesso aos bens sociais.

Para Vanda, o Estado tem a obrigação de garantir a equidade entre as pessoas. “Afinal, o acesso aos bens sociais é um campo em constante disputa, não há posições vantajosas para todos. A sociedade não pode caminhar autonomamente, entregue unicamente ao critério de mérito, porque justamente as relações sociais na sociedade capitalista são geradoras de desigualdades que precisam ser mediadas.”. Ela complementa dizendo que um Estado forte não deve prescindir da liberdade básica do indivíduo, precisa na verdade buscar um equilíbrio capaz de dar continuidade à ideia de que todos/as possam cooperar na vida social e que nenhum grupo viva de maneira indigna.

A Educação Proibida


“A Educação Proibida” é um documentário que se propõe a questionar as lógicas de escolarização moderna e a forma de entender a educação, visibilizando experiências educativas diferentes, não convencionais, que propõem a necessidade de um novo paradigma educativo.
A Educação Proibida é um projeto realizado por jovens que partiram da visão dos que aprendem e se empenharam em uma investigação que cobre 8 países, realizando entrevistas com mais de 90 educadores de propostas educativas alternativas. O vídeo foi financiado coletivamente graças a centenas de co-produtores e tem licenças livres que permitem e estimulam sua cópia e reprodução.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Contos de fadas


A partir do jardim, o dia é finalizado com um conto de fadas, rico alimento para a alma e a imaginação infantil, pois contém imagens de profunda realidade espiritual, atingindo regiões inexploradas do inconsciente. No maternal ( 2 e 3 anos), as histórias são mais simples, em respeito à peculiaridade desta fase, não se utilizando ainda os símbolos dos contos de fadas.









Escola Conviver